domingo, julho 06, 2008

O capital que nos espreita

Néstle contratou Securitas para espiar actividades da ATTAC


Era um punhado de jovens, activistas da associação ATTAC em Lausanne, que tinha decidido investigar as actividades de uma das grandes multinacionais suíças: a Nestlé. O tema não era inocente, porque não se tratava de ver como eram feitas papinhas para criar bebés sorridentes, rosados e gordinhos. Da investigação não iria resultar um cliché de publicidade sobre a empresa que mata a fome às crianças do mundo.

Pelo contrário: tudo levava a crer que a Nestlé ficaria mal na fotografia, que a sua voracidade pelos lucros poderia ser relacionada com a destruição de recursos naturais, com a perseguição de sindicalistas latino­‑americanos, e em especial com a política de privatização da água.

Mas lá por a investigação ser preocupante para os administradores da Nestlé, isso não os autorizava a tratarem a ATTAC como potencial organização terrorista. Os tribunais e a polícia nunca poderiam, em todo o caso, fazê­‑lo.

A Nestlé não esteve portanto com meias medidas: encomendou à Securitas uma operação de espionagem. A Securitas, por sua vez, contratou uma jovem que se apresentou com um nome falso ao grupo de trabalho da ATTAC, manifestou interesse e assumiu tarefas na investigação, insinuou-se no círculo de amizades pessoais do grupo, frequentou as suas casas, obteve listas de endereços de correio electrónico e endereços postais.

Um belo dia, quando a investigação estava concluída e se preparava a sua publicação em livro, a infiltrada desapareceu. Agora, anos depois, o caso foi desmascarado. A Securitas confirmou a infiltração na ATTAC e a polícia do cantão de Vaud admitiu, embaraçada, que tinha conhecimento da sua existência. Segue-se um processo judicial contra a Nestlé e contra a Securitas, bem como uma responsabilização da polícia, promovida pelos grupos parlamentares da esquerda, por ter permitido que se desenvolvesse uma operação em que era violada a privacidade de cidadãos e cidadãs que nada fizeram senão procurar a verdade sobre as malfeitorias da Nestlé.

Entretanto, o sindicato da polícia suíça tomou posição num comunicado de imprensa considerando escandalosa a cumplicidade da polícia neste caso. No plano nacional, ao abrigo da lei de protecção de dados, foi exigido à Securitas o esclarecimento de todo o assunto e a chefe do Departamento da Polícia pediu igualmente contas. Vários partidos políticos e organizações emitiram declarações e interpelaram o parlamento do cantão.


Fonte: Mudar de Vida

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